segunda-feira, 1 de agosto de 2011

Resolução

Há muito pensei em abandonar
O verso e a prosa e o romance e os contos,
Há muito que eu não escrevia
E nem tinha vontade.
Mentira.
Eu tinha.
Só achei que não podia.
E se eu não podia, eu não escrevia.
Acontece que fui fadado a ser contente.
A alegria pirilimpimpim...
E a felicidade lariradirá...
Mas a verdade é que sou triste.
Simples assim. Pronto.
Ponto.
Falei.
E me sinto melhor. Sou triste.
Sou triste e não sou poeta.
Ainda que fosse não seria.
E, pelo amor de Deus, se é que Deus existe,
Se não sou poeta, pelo menos deixe-me ser triste.
Fernando e Cecília eram. Eram poetas.
Então deixe-me igualar a eles pelo menos na tristeza.
Porque assim, mesmo que não poeta, pelo menos poderei escrever.
Porque - e repare na deselegante ironia - é possível
Cantar a alegria cantando-se um fado?
Já que mais cedo ou mais tarde morreria de morte morrida,
Calado,
Com nós na garganda e papas na língua,
Preferi morrer de morte matada: sem fado algum.
O que eu era acreditava em uma continuação e o que sobrou
Acredita que seremos só cinza e pó. E vento. E fumaça. Vulcânica.
Carbono.
Adubo.
Mas... vai que?
E então, nasceria limpo. E talvez fosse feliz...
Porque estaria leve, porque um dia escrevi.
E seria belo. E seria um cravo. E lutaria pela rosa - de novo.
É dos corpos que crescem as flores.
E tudo voltaria à ordem normal. E o fado seria triste
Como nunca deveria ter deixado de ser.

3 comentários:

Amanda N. disse...

E o que importam o que pensam, ou deixam de pensar? Que os mistérios fiquem no ar... que deixe brotar uma amargura nos corações alheios... se escrever lhe traz felicidade, então escreva. Porque não há tristeza que se disfarce tão bem nem por muito tempo. Pode ser uma música, uma identificação, uma palavra ou uma falta de palavra, um olhar, a falta de um toque... já era sabido, mesmo. Então escreva e nunca deixem te parar.

Gabriela disse...

Existe mais felicidade na tristeza
do que pensam existir.
Existe mais beleza no seu poema
do que muitas vezes vi.
E intensidade
e presença
e voz.
Provavelmente não por acaso me lembrou o Pessoa. De novo.

"Há mais eus do que eu mesmo.
Existo todavia
Indiferente a todos.
Faço-os calar: eu falo.

Os impulsos cruzados
Do que sinto ou não sinto
Disputam em quem sou.
Ignoro-os. Nada ditam
A quem me sei: eu escrevo."


Seja feliz vivendo a sua trsiteza e, como Fernando e Cecília, seja.
Poeta.
Aliás, você é.

Assisti "Fados" uma vez e, levada pelas canções, ao terminar, me senti leve e feliz. E queria sair por aí, cantando fados e sendo triste alegremente. Paradoxos não existem apenas em teoria.

Copio sem culpa (porque aquilo que vale a pena ser repetido deve ser feito desavergonhadamente) o final do comentário da Amanda: "Então escreva e nunca deixem te parar".

Luísa disse...

"Acontece que fui fadado a ser contente."

~ouch~

ainda acho que o que dói na tristeza é, na verdade, saudade da alegria.